Bate-papo feminista: Carolina de Araújo (UFRJ)

Carolina Araujo

Professor de Filosofia da Universidade Federal do Rio de Janeiro

09/03/2017 • Entrevistas

No ano de 2015, uma pesquisa inédita revelou como a presença das mulheres na Filosofia diminui no percurso entre a graduação até a docência. Este trabalho foi realizado pela professora do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Carolina Araújo. 

Ela comparou a proporção de homens e mulheres no curso em três momentos distintos da carreira: mestrado, doutorado e docência. Sua conclusão foi de que a proporção de mulheres cai durante a pós-graduação e ao longo da carreira docente. Em 2015, as matrículas de alunas no mestrado e doutorado respondiam por 28,45% do total em 2015. O número diminui mais quando se trata das docentes permanentes: 20,94% de mulheres.

Para realizar estre trabalho ela utilizou os dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), segundo os quais, entre os graduados em filosofia no Brasil em 2014, 38,4% eram do sexo feminino. Em seguida, compilou os nomes de 4.437 alunos e docentes dos 44 programas de pós-graduação em filosofia do país registrados na Plataforma Sucupira, banco de dados mantido pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) que fornece dados sobre a comunidade acadêmica brasileira.

Esta pesquisa inspirou as mulheres da área e, em 2016, foi discutida no GT de Filosofia e Gênero do Encontro da Anpof. Nesta semana das mulheres, damos mais uma vez destaque a este inédito trabalho de Carolina. Abaixo, veja o bate-papo com ela sobre esse trabalho e como ela compreende a presença da mulher na Filosofia.

1. A sua pesquisa é pioneira em nossa área. O que te motivou realizá-la? O resultado dela, de alguma forma, já era percebido por você?

Basta freqüentar a comunidade filosófica para constatar o significativo contraste no número de homens e mulheres; um contraste que se acentua nos níveis mais altos da carreira, e não só no Brasil. A pesquisa pode ser inovadora no Brasil, mas essa é uma agenda internacional há muito tempo. A minha motivação foi descobrir o quão grave era o nosso cenário.

2. Apesar de você não trazer na sua pesquisa possíveis razões que justificam esse número, quais dificuldades você acredita que as mulheres enfrentam na academia, na Filosofia, que levam a esse afunilamento?

Há razões de muitas ordens e é leviano supor que podemos achar um bode expiatório. Há desinteresse das mulheres pela carreira, já que elas são minoria desde o ingresso na graduação. Há dificuldades em compatibilizar o desenvolvimento da capacidade argumentativa e uma educação sexista, que tacitamente ensina às mulheres o (falso) valor de ceder em sua posição e de atenuar seus discursos. Há filósofos homens que têm dificuldades em aceitar orientandas mulheres, por vários motivos. Há uma cultura estabelecida que não se importa com a ausência de mulheres em determinados ambientes. Há a difícil conciliação entre maternidade e carreira. Enfim, são vários os motivos.

3. Ainda que os números sejam desanimadores, vemos sua pesquisa ganhar espaço e ser acolhida e debatida entre nossos pares. No ano passado, pela primeira vez, tivemos um GT de Filosofia e Gênero em um encontro da Anpof. Você acredita que as questões concernentes à mulher tem ganhado espaço nos departamentos de Filosofia?

Não é possível dar uma resposta precisa a essa questão porque não há dados e eu não conheço os departamentos em geral. Para formular uma hipótese que refutaria uma afirmação como essa, eu diria que é possível que na década de 1980, em que uma abordagem social da filosofia tinha mais presença nos departamentos, pesquisas referentes à mulher estivessem proporcionalmente mais presentes do que hoje. Se isso for verdade, pode ter havido uma diminuição desse espaço, ao invés da sua ampliação. Mas talvez isso importe menos, e o que interessa é que nós transformemos esse momento em uma ocasião para chamar atenção para a desigualdade e fomentar a educação filosófica das mulheres.

 

ANPOF (biênio 2017-2018)

09 de Março de 2017

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