INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL E ÉTICA: UM DIÁLOGO COM LIMA VAZ
Kriterion, v. 64, n. 154 (2023) • Kriterion: Revista de Filosofia
Autor: Mariah Brochado
Resumo:
Os feitos tecnológicos deste início de século levaram a humanidade a mitificar os processos maquínicos de alta performance funcional, a ponto de considerar programas computacionais como entidades inteligentes, as quais têm ampla aplicação em todos os setores da sociedade, como execução de atividades antes reservadas exclusivamente a humanos, na medida em que as realizam de forma infinitamente mais veloz, precisa e eficiente. A Ciência da Computação, associada à Robótica, tem obtido resultados estarrecedores na projeção (design) incorporada de máquinas muito similares aos humanos (androides e ginoides), destinados a executar tarefas ainda mais ambiciosas, como a de se relacionar afetivamente com humanos. Entre esses feitos, o que chama especial atenção é a possível criação de máquinas moralmente mais elaboradas que os próprios humanos. Essa ambição toca diretamente os estatutos da Ética filosófica, desde a sua fundação socrática originária como ciência do ethos e, entre os filósofos que mais se dedicaram a refletir sobre os desafios e dilemas éticos do século XX, figura Henrique Cláudio de Lima Vaz, brasileiro de produção acadêmica e envergadura intelectual invulgares. Deixando um legado monumental à filosofia brasileira, Lima Vaz ocupou-se de diversificadas temáticas do nosso tempo, e suas reflexões seguem tão atuais quanto desafiadoras, atraindo intelectos, que se pretendam rigorosos, a revisitar sua vasta obra e buscar nela inspiração aquilatada para enfrentar questões urgentes dessa nova era que se anuncia. Uma dessas questões é a relação aqui apresentada entre os feitos da Inteligência Artificial e a referência vaziana ao processo mutacional ora vivido. Este artigo parte, portanto, da obra de Lima Vaz para apresentar alguns questionamentos éticos sobre as experiências inusitadas vividas hoje no horizonte de uma cultura altamente tecnicizada, as quais sujeitam o humano ao império de uma suposta superioridade maquínica, o que acaba por impactar nosso universo simbólico, colocando sob suspeita alguns atributos intocáveis da essência espiritual que nos constitui, como a noção de consciência, abertura à transcendência irredutível aos feitos mais eloquentes de qualquer evolução técnica.
Abstract:
The technological achievements from the beginning of the century have led humanity to mythify the processes of high functional performance of machines, to the point of considering computer programs as intelligent entities, which have wide application in all sectors of society as the execution of activities previously reserved exclusively for humans, which they perform infinitely faster, more precise and more efficient than humans. Computer Science, associated with Robotics, has obtained amazing results in design of embodied machines very similar to humans (androids and ginoids), destined to perform with affectively with humans. Among these achievements, the one that draws special attention is the possible creation of machines morally more elaborate than humans themselves. This ambition touches directly the statutes of philosophical Ethics, since its original Socratic foundation as a science of ethos. Among the philosophers most dedicated to reflecting on the ethical dilemmas of the 20th century, we find Henrique Cláudio de Lima Vaz, a Brazilian philosopher of rare intellectual stature and enviable academic production. Lima Vaz devoted his reflections to several themes of our time, and his thought continues to inspire current reflections on issues of this century. One of these questions is the relationship presented here between the achievements of Artificial Intelligence and what he calls civilizational mutation, a new radical change in the civilizational flow of human experiences. This article departs, therefore, from the Lima Vaz’s thought to present some ethical questions about the unexpected experiences lived today in the horizon of a technicized culture, which subject the human to the empire of a supposed machinic superiority, which ends up impacting our symbolic universe, putting under suspicion some untouchable attributes of the spiritual essence that constitutes us, such as the notion of consciousness, openness to transcendence irreducible to the most eloquent achievements of any technical evolution.
ISSN: 1981-5336
DOI: https://doi.org/10.1590/0100-512X2023n15404mb
Texto Completo: https://www.scielo.br/j/kr/a/4NKGBGSPn3J8KDBb44VBTBf/?lang=pt
Palavras-Chave: inteligência artificial; civilização; ética; direito
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